Os números falam por si (sábado, 27 de março):
- 1.870.631 vacinas administradas. 667.303 pessoas receberam a segunda dose.
- 10.157 novos infectados e 253 óbitos – 19.499 total de mortes.
- 11.779 húngaros hospitalizados e 1.512 nos cuidados intensivos (ventiladores).
Por milhão de habitantes, a Hungria é nestes dias, em número de mortes, de internados e de novos casos infectados, o pior ou um dos piores países do mundo para se estar. Quanto à vacinação, com 21.6% da população já vacinada com a primeira dose, a Hungria é desde hoje o país mais vacinado da UE.
Como se chegou a este estado?
Pelo amadorismo gritante e ”propaganda Orbán do sucesso” a mais. Pelo profissionalismo e estratégia efetiva de combate à pandemia a menos.
Uma das frases icónicas do nosso Orbán é: ”olhem para o que eu faço e não prestem atenção ao que eu digo”… assim pelo menos só ”finta” quem quer ser ”fintado” pelo seu verbo fácil e verbalismo épico…
Quanto aos seus atos heróicos realizados nestes últimos meses… vejam os números, guardem um minuto de silêncio, entrem na igreja mais próxima, rezem pelos profissionais da saúde, acendem uma vela pelos falecidos e peçam clemência a Deus… apenas com o nosso Viktor dificilmente chegaremos lá, e à custa de muitas mais vítimas mortais…
No meio deste caos, para ilustramos, buscamos uma frase por mês desde o início deste ano e como a situação em março tem sido gravíssima, duplicamos as frases, do ”nosso Chefe”, retiradas do seu exercício verbal das sextas de manhã na Kossuth Rádio…
Em janeiro: “Trouxemos o vírus para o tapete de luta”. Em fevereiro: “Até agora o vírus atacou e nós defendemos, agora é o contrário, estamos ao ataque e o vírus está à defesa”. Em março: “É certo que com este encerramento de duas semanas, vamos chegar à linha de chegada, estamos agora na fase final da guerra contra o vírus, na reta final da linha da meta”. Esta sexta-feira de manhã declarou para ser ouvido nos 4 cantos da Hungria e nos 5 cantos do mundo: “Não tenho dúvidas de afirmar que aqui na Hungria o nosso verão será livre”.
Não tenham medo, que não se esgotou, novas declarações bombásticas já estão na prateleira do argumentário inesgotável de Orbán…
A situação é crítica
O caos no nosso sistema nacional de saúde cresce dia a dia, hora a hora e já nem dá para ”envernizar” mas mesmo assim, os cânticos de vitória continuam, como se a realidade paralela da propaganda do Fidesz se tivesse tornado a própria realidade do governo. Na ”realidade real” o número de húngaros infetados, hospitalizados, ligados aos ventiladores e falecidos nao pára de aumentar. Vertiginosamente.
A dura realidade é que estamos pior do que a Itália estava nesta altura do ano passado com a primeira onda covid ou que a República Checa na segunda vaga. No mundo temos o maior número de mortes e hospitalizados por habitante.
Orbán já sabe – o homem sabe tudo – quem é o culpado disto!
A oposição anti-vacinação. O novo inimigo da nação magyar!
A oposição é antivacina! Ouvimos e vemos e lemos, dia e noite, em todos os comprimentos de onda. Claro, que a ”malvada oposição” não é antivacinação. Até os militantes-propagandistas pró-governo sabem disso, mas também sabem que a mentira repetida mil, dez mil vezes…
A oposição não é antivacina, discorda das medidas do governo para enfrentar a pandemia com eficácia. Acusa o governo de se apropriar dos meios, mesmo os das autarquias locais, porque é assim que quer obter ”em exclusivo” o capital político da gravíssima situação em que todos estamos a viver, na qual se incluem os votantes e simpatizantes de Orbán. Para já, o tiro está-lhe a sair pela culatra…e se dispara, não está a acertar no alvo…
Um momento para recordar as prioridades de Orbán: desporto, igreja e… saúde.
Entre março de 2020 e março de 2021, as transferências decididas pelo governo entre setores e novas prioridades do orçamento de estado aprovado e suas reservas mostram
Desporto: 288,6 mil milhões de forints
Igrejas:153,6 mil milhões de forints
Saúde/Hospitais: 60,7 mil milhões de forints.
Para confirmar esta absurdidade basta consultar o “Magyar Kőzlőny” (Jornal Oficial) e ver as decisões tomadas pelo governo de Orbán. É difícil continuar a contar as suas histórias para crianças do jardim de escola…
Afinal o Homem é infalível ou não é?
Sei apenas que a comunicação e a propaganda estão a correr muito mal à máquina do Fidesz… o nosso Viktor nem parece o mesmo…
Não é só a ele. Há outros casos lá fora que também ficam aquém das expectativas. Por exemplo Netanyahu, após o êxito da vacinação em Israel, esperava que a realidade de um país a regressar ao normal muito mais cedo que os outros países, que nas eleições recentemente realizadas, fosse suficiente para obter uma maioria clara, mas os eleitores israelitas não ficaram totalmente convencidos.
Aqui na Hungria
Na verdade quando tudo predestinava que o aproveitamento político da compra alternativa de vacinas à Rússia e à China, com o consequente número de vacinação muito superior aos outros países da UE, e assim poder ser o primeiro desfraldar e agitar a bandeira do ”bom pai do grande chefe-pastor” que cuida dos seu rebanho melhor que os outros, eis que apesar de ser verdade que em relação aos outros, muitos mais de nós já fomos vacinados – primeira e segunda dose -, o número de infetados, de hospitalizados, de ligados aos ventiladores e de mortes, colocam a Hungria como o pior, ou dos piores países do mundo.
O sucesso da vacinação está a ser anulado, neutralizado pela vertigem da tragédia da pandemia.
O “nosso Viktor” parece que perdeu a noção da realidade e continua, sobretudo nas entrevistas das sextas-feiras ao Kossuth Rádio, a contar histórias e fábulas para crianças, como se não soubesse que a ”luta contra o covid-19” é muito diferente da ”luta contra Bruxelas, Soros ou migrantes”.
A Juli néni (tia Julia) e o Józsi bácsi (tio Zé) conheciam há dezenas de anos a vizinha Kati néni e Feri bácsi que morreram, e que não foram, nem ela, violada pelos migrantes, nem ele, roubado por Soros…
É verdade que mesmo pelo cano da torneira continua a correr propaganda que a oposição – esquerda e os liberais anti-pátria – são contra a vacina, são aliados da pandemia, mas a ”conversa” não está a colar, a mentira não está a passar… São os magyar (húngaros) que estão a morrer sob o governo de Orbán, no poder há 11 anos…
Uma última comparação que fala por si
A Alemanha tem 83 milhões de habitantes e na sexta-feira registou 183 óbitos. Para a Hungria com menos de 10 milhões, o número de óbitos proporcional seria 22… morreram 275 húngaros…
Budapeste, 28 de março de 2021
Crédito da foto: Tövissi Bence