Portugal: Receita de IRS bate recorde no ano da maior recessão da democracia

por LMn
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Finanças explicam com um nível de emprego acima do esperado, aumento dos rendimentos e um efeito de arrastamento ainda do IRS de 2019.

Por Paulo Ribeiro Pinto – Jornal Económico

o ano passado, o fisco arrecadou mais de 13,5 mil milhões de euros em receita de IRS. Trata-se do valor mais alto de sempre, num ano em que a economia terá registado a maior queda dos últimos 50 anos.

Os dados da síntese de execução orçamental, da Direção-Geral do Orçamento (DGO) podem ainda ser alvo de algum ajuste, mas a diferença não será relevante. O valor está também acima da previsão que o Ministério das Finanças inscreveu no Orçamento do Estado para 2021.

De acordo com os cálculos do Dinheiro Vivo, trata-se de um desvio positivo de 2,7% face às contas que João Leão apresentou ao parlamento em outubro do ano passado, correspondendo a mais 354 milhões de euros cobrados aos contribuintes.

Comparando com 2019 – quando a economia cresceu 2,2% -, a receita arrecadada no ano passado subiu 3%, o que significou mais 393 milhões de euros nos cofres do Estado. A primeira estimativa do Instituto Nacional de Estatística (INE) aponta para uma queda histórica de 7,6% do produto interno bruto (PIB) em 2020.

A economia afunda para o pior registo dos últimos 50 anos, mas a receita tem o melhor desempenho de sempre.

Emprego, salários e IRS de 2019

Os dados disponíveis ainda não permitem uma análise mais fina do que aconteceu ao certo, mas o Ministério das Finanças aponta algumas explicações para este comportamento aparentemente paradoxal da receita de IRS.

Em primeiro lugar, o nível de emprego parece estar imune à queda abrupta da atividade económica. “À partida, tendo em conta os dados do INE, o emprego caiu 1,1% em 2020. Uma queda muito ligeira face ao esperado”, refere fonte das Finanças ao Dinheiro Vivo.

A este dado junta-se o facto de o desemprego estar a atingir uma franja de trabalhadores pouco qualificados com salários baixos e que já não pagam IRS ou que têm retenções muito baixas. “No terceiro trimestre de 2020, comparação homóloga, onde por profissão a população empregada mais caiu, dois terços é nos trabalhadores não qualificados”, refere a mesma fonte.

A análise feita pelo gabinete de João Leão aponta ainda outra justificação relacionada com o mercado de trabalho: as remunerações dos trabalhadores estavam a subir no terceiro trimestre do ano passado mais de 4% em termos homólogos.

Mas o principal motivo para o aumento de 393 milhões face ao ano anterior está relacionado com a “campanha de IRS” referente aos rendimentos de 2019 que acabou apenas em agosto/setembro. “Há um grande volume da receita que depende da campanha de IRS”, nota fonte das Finanças.

Há “um efeito de arrastamento” por causa dos acertos que é preciso fazer face às retenções e cujo valor apenas é apurado com a liquidação: ou recebe reembolso ou tem nota de cobrança para pagar ao fisco.

“Para o excesso face 2019 (393 milhões), 80% diz respeito à campanha de IRS. Ou seja, mais ou menos 40% para as notas de cobrança e outros 40% para a variação dos reembolsos”, detalha fonte das Finanças. “Só os outros 20% é que dizem respeito ao aumento das retenções na fonte ou das remunerações referente ao ano de 2020”, conclui.

“Burguesia” imune

“É preciso ter em conta a dinâmica própria do IRS”, sublinham as Finanças para rebaterem os argumentos de economistas que avisam para o agravamento das desigualdades com esta crise pandémica.

“As pessoas que sentiram o impacto maior foram as que estiveram em lay-off total, com cortes salariais e essas são pouco qualificadas, com salários baixos que já não pagavam IRS, por isso não teve efeito na receita”, argumenta a economista Susana Peralta, da Nova SBE.

“Esta não é uma crise da burguesia. Os trabalhadores dos setores intelectuais, que não implicam deslocações, ficaram em casa em teletrabalho e não foram afetados”, frisa. “O caso do aumento da receita do IRS é uma demonstração clara de que esta crise representa um agravamento das desigualdades. Tem uma dimensão de classe”, conclui.

Fonte das Finanças reconhece que, tendo em conta os dados do INE do terceiro trimestre, são os trabalhadores menos qualificados que são, de facto, os mais afetados, mas atribui o bom desempenho da receita a fatores como a queda menos acentuada do emprego ou o aumento das remunerações, mas sobretudo à campanha do IRS de 2019.

Fonte: Jornal Económico

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