Moçambique: Ministro das Pescas de Guebuza desaconselhou criação de empresa de atum – arguido

por LMn | Lusa
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O arguido Teófilo Nhangumele, uma das peças-chave do processo das ‘dívidas ocultas’, disse hoje em tribunal que o antigo ministro das Pescas Vítor Borges “desaconselhou” a criação da empresa de pesca de atum que recebeu parte dos empréstimos.

“Lembro-me que ele [Vítor Borges] tinha um trauma das antigas empresas estatais e disse-nos para não embarcarmos na criação de uma empresa de pesca”, afirmou Nhangumele.

A firma em causa trata-se da Empresa Moçambicana de Atum (Ematum), que recebeu 850 milhões de dólares (720 milhões de euros) dos 2,2 mil milhões de dólares (dois mil milhões de euros) de empréstimos mobilizados com garantias prestadas pelo Governo moçambicano, entre 2012 e 2013, sem o conhecimento do parlamento e do Tribunal Administrativo, conhecidos como ‘dívidas ocultas’.

Teófilo Nhangumele disse em tribunal que, num encontro em 2011, o então ministro das Pescas desaconselhou a criação de uma empresa estatal de pesca.

Segundo o arguido, Vítor Borges manifestou a sua oposição à fundação da Ematum, quando deu conta da pretensão de constituição de empresas que iriam servir de veículo para o financiamento do projeto de proteção costeira de Moçambique.

O Sistema Integração de Proteção Marítima foi o projeto justificado pelas autoridades moçambicanas da época para a mobilização dos empréstimos.

“O projeto inicial não tinha nada a ver com pesca, não incluía pescaria”, declarou Nhangumele.

A iniciativa, prosseguiu, visava apenas a criação da Proidincus, empresa de proteção costeira, com um custo orçado em 360 milhões de dólares (305 milhões de euros).

Uma terceira empresa, também criada no âmbito do projeto de proteção costeira, Mozambique Assets Management (MAM), também não fazia parte do plano inicial, tendo surgido depois, acrescentou.

“Provavelmente, foi a criação dessas empresas que fez subir o custo do projeto inicial”, declarou Teófilo Nhangumele.

Nhangumele disse que a Ematum e MAM foram criadas depois de o então ministro da Defesa Nacional e atual Presidente da República, Filipe Nyusi, ter dito ao arguido para deixar de ser parte do processo de implementação do projeto de proteção costeira, uma vez que não era funcionário do Estado.

Na audição de quinta-feira, Teófilo Nhangumele disse em tribunal que recebeu 8,5 milhões de dólares (7,2 milhões de euros) da empresa acusada de pagar subornos com o dinheiro das ‘dívidas ocultas’, Privinvest, pelo seu trabalho de consultoria prestado à empresa, ao abrigo de um contrato que assinou após ser dispensado pelo ministro da Defesa.

O arguido envolveu-se nos encontros em que a Privinvest, com sede em Abu Dabi, apresentou soluções em equipamentos para o sistema integrado de proteção da costa moçambicana, através de um convite informal do antigo diretor de Estudos e Projetos do Serviço de Informação (SISE) e arguido no caso Cipriano Mutota.

Nhangumele, descrito por Mutota como “colaborador do SISE”, acabou por ser uma peça-chave nas reuniões exploratórias entre a Privinvest e as autoridades moçambicanas da época, pelo domínio da língua inglesa e experiência em trabalhos com multinacionais.

Nas alegações que leu na segunda-feira, o Ministério Público acusou os 19 arguidos das ‘dívidas ocultas’ de se terem associado em “quadrilha” para delapidarem o Estado moçambicano e deixar o país “numa situação económica difícil”.

“Quem se associa em quadrilha para roubar ao Estado não está ao serviço do Estado. Os arguidos agiram em comunhão, colocando os seus interesses particulares acima dos interesses do Estado”, referiu Ana Sheila, magistrada do Ministério Público.

A conduta dos 19 arguidos, prosseguiu, delapidou o Estado moçambicano em 2,7 mil milhões de dólares angariados junto de bancos internacionais através de garantias prestadas pelo Governo.

Para o Ministério Público moçambicano, entre os diversos crimes que os arguidos cometeram incluem-se associação para delinquir, tráfico de influência, corrupção passiva para ato ilícito, branqueamento de capitais, peculato, abuso de cargo ou função e falsificação de documentos.

As ‘dívidas ocultas’ foram contraídas entre 2013 e 2014 junto das filiais britânicas dos bancos de investimentos Credit Suisse e VTB pelas empresas estatais moçambicanas Proindicus, Ematum e MAM.

Os empréstimos foram secretamente avalizados pelo Governo da Frelimo, liderado pelo presidente da República à época, Armando Guebuza, sem o conhecimento do parlamento e do Tribunal Administrativo.

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