A Demora
O amor nos condena:
demoras
mesmo quando chegas antes.
Porque não é no tempo que eu te espero.
Espero-te antes de haver vida
e és tu quem faz nascer os dias.
Quando chegas
já não sou senão saudade
e as flores
tombam-me dos braços
para dar cor ao chão em que te ergues.
Perdido o lugar
em que te aguardo,
só me resta água no lábio
para aplacar a tua sede.
Envelhecida a palavra,
tomo a lua por minha boca
e a noite, já sem voz
se vai despindo em ti.
O teu vestido tomba
e é uma nuvem.
O teu corpo se deita no meu,
um rio se vai aguando até ser mar.
Mia Couto, in “idades cidades divindades”
“Rir junto é melhor que falar a mesma língua. Ou talvez o riso seja uma língua anterior que fomos perdendo à medida que o mundo foi deixando de ser nosso”, escreveu António Emílio Leite Couto, mais conhecido pelo seu pseudónimo, Mia Couto, que nasceu na Beira em 5 de julho de 1955. Adotou o seu pseudónimo porque tinha uma paixão por gatos.
Com 14 anos de idade, teve alguns poemas publicados no jornal “Notícias da Beira” e três anos depois, em 1971, mudou-se para a capital de Moçambique, então Lourenço Marques (hoje Maputo). Iniciou os estudos universitários em medicina, que abandonou no princípio do terceiro ano, passando, depois do 25 de Abril de 1974, a ser jornalista. Trabalhou na Tribuna até à destruição das suas instalações em Setembro de 1975, por colonos que se opunham à independência. Foi nomeado diretor da Agência de Informação de Moçambique (AIM) A seguir trabalhou como diretor da revista Tempo até 1981 e continuou a carreira no jornal Notícias até 1985.
Em 1983, publicou o seu primeiro livro de poesia, Raiz de Orvalho, que, segundo algumas interpretações, inclui poemas contra a propaganda marxista militante Dois anos depois, demitiu-se da posição de diretor para continuar os estudos universitários na área de biologia. https://pt.wikipedia.org/wiki/Mia_Couto
Crédito da foto: Página FB Mia Couto