“Não há futuro da Hungria sem crianças húngaras” discursava Viktor Orbán, pai de cinco filhos, há dias, elogiando o programa CSOK (beijo, em húngaro) que consiste numa série de incentivos económicos com vista a fomentar o nascimento de mais bebés húngaros. Há quem lhe chame a “máquina de fazer bebés húngaros”, a verdade é que dentro deste programa estão algumas medidas generosas como: isenção de imposto sobre o rendimento para mulheres com mais de quatro filhos; ajudas de custo na compra de casa; perdão de empréstimos; empréstimos sem juros até 10 milhões de florins; ajuda na compra de carrinhas familiares de 7 lugares; maior período de férias, entre outros.
Depois da Queda do Muro de Berlim, o leste da Europa perdeu sensivelmente 15 milhões de pessoas devido a uma fortíssima e continuada emigração. A Hungria não foi excepção. De acordo com a ONU, este país é o 10º país onde a população mais tem decrescido. Foi com estes dados alarmantes que Orbán discursou “precisamos de uma revolução demográfica”.
O famoso programa CSOK lançado pelo Fidesz parece estar a dar resultado. De acordo com as estatísticas, a taxa de fertilidade da mulher húngara era de 1.2 antes em 2010 antes do Governo de Orbán, passando para 1.5 em 2018, sendo que a meta (talvez exagerada) é a de 2.1 crianças por cada mulher húngara em 2030.
Na minha opinião, esta “revolução demográfica” de Orbán leva consigo uma contradição quase grotesca. É que senão veja-se: alguém pareceu esquecer-se que a emigração de jovens para fora da Hungria continua a aumentar de forma avassaladora (quase 600 mil húngaros vivem fora da Hungria), com um aumento substancial em 2018. Ou seja: os bebés nascem na Hungria, mas os jovens vão-se embora do país. Isto faz sentido? Se existem políticas para aumentar o número de bebés, deveriam haver mais para fixar os jovens neste país. A isenção de impostos para pessoas até 25 anos parece promissor, mas é preciso uma revolução fiscal mais contundente (mas sobre isto falarei num próximo artigo).
Outro problema é que a obsessão natalista de Orbán é tal que parece ter mais em conta as prioridades do seu programa político do que as prioridades das próprias mulheres. “Há uma politização do útero da mulher húngara” diz Zsuzsana Simon numa entrevista na Euronews, para quem o governo não se devia meter em decisões que devem pertencer unicamente à mulher. Ela fala também de que o Governo pode estar também a contribuir para uma maior exclusão social de quem não tem filhos.
Mas o dilema mantém-se. Na Europa do sul e de leste assiste se a um envelhecimento da população (causado sobretudo pela emigração e dificuldades económicas) que pode ser catastrófico para os nossos Estados Sociais largamente dependentes de receita vinda de impostos. Por outras palavras, se há cada vez menos população ativa – no presente e no futuro – a descontar impostos, como poderá o Estado manter as suas elevadas despesas sociais? Alguns especialistas apontam a imigração como possível resposta para colmatar o declínio e envelhecimento populacional.
Parece me, por fim, ser esta a principal preocupação de Orbán. “Este programa visa defender o futuro da Hungria sem depender dos imigrantes” discursava o Primeiro-Ministro em 2019. Para além do conservadorismo ou dos problemas económicos, o verdeiro desafio demográfico de Orbán parece ser o de manter a Hungria geneticamente “pura”, fazendo lembrar períodos da história mais negros.
Budapeste, 02 de junho de 2021