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Cinco livros especiais (e outras razões) que justificam ir à Feira do Livro

A 90.ª Feira do Livro de Lisboa reabre as portas esta quinta-feira com a presença do Presidente. Na sexta-feira, é a vez da do Porto. Há muitos bons livros para comprar, mas cinco serão imperdíveis.

Após ter sido adiada três meses, a 90.ª edição da Feira do Livro de Lisboa abre portas esta quinta-feira e assim ficará até 13 de setembro. Localização, a mesma dos últimos anos: Parque Eduardo VII. O melhor local para se manter o distanciamento social próprio da época e com uma lotação máxima de 3300 leitores.

A informação oficial revela que esta 90.ª edição “tem a maior oferta editorial de sempre”, ou seja o regresso à leitura começa em força. São ·310 pavilhões, 117 participantes e representação de 638 marcas editoriais. Não será a maior Feira do Livro de sempre em Lisboa mas fica em segundo lugar, atrás da de 2018.

Desta vez, o cuidado com a pandemia está presente desde as entradas das duas alas, onde há desinfetante para as mãos e controlo de visitantes. Será obrigatório o uso de máscara em todo o recinto, tanto por expositores, como pelo público visitante. Segundo a Associação Portuguesa de Editores e Livreiros (APEL) e a Câmara Municipal de Lisboa, a distribuição dos pavilhões foi de modo a afastá-los mais do que era habitual e houve uma redução dos espaços de restauração, bem como evitar que estes permitam que os leitores se sentem como antes, e aumentaram as atividades ao ar livre.

Se a organização considera que a lotação máxima prevista para o recinto oferece “uma ampla margem de segurança”, também se exige um distanciamento social de dois metros entre pessoas enquanto decorrem cerca de 800 atividades, a Hora H com descontos mínimos de 50% em livros lançados há mais de 18 meses, entre segunda e quinta-feira entre as 21.00 e as 22.00.

Quase igual fica a ementa que interessa aos leitores que vão até ao Parque Eduardo VII para comprar livros: muitos lançamentos e apresentações de livros, sessões de autógrafos – com inscrição prévia junto das editoras.

De regresso está a missão “Doe os seus Livros”, uma iniciativa da APEL e do Banco de Bens Doados (BBD) que desafia os visitantes a doar os livros novos ou usados que não queiram guardar (há um pavilhão específico, junto à entrada Sul do Parque Eduardo VII) para que estes possam ganhar novos leitores. O Presidente da República será um dos que por aí passarão para doar livros e estará presente na inauguração oficial do evento esta quinta-feira pelas 17.00.

Horário da Feira: ·segunda a quinta 12.30 às 22.00; sexta: 12.30 às 00.00; sábado: 11.00 às 00.00; domingo: 11.00 às 22.00.

Quanto a novidades literárias, elas não faltam. Até porque a quase totalidade dos lançamentos entre finais de março e até julho foram adiados e só apareceram nos últimos dias nas livrarias reabertas. Não vão faltar livros de todos os géneros nesta 90.ª edição da Feira do Livro de Lisboa – e simultaneamente na do Porto. E podem-se destacar cinco livros, de vários géneros, que estão na Feira logo desde o início e outros que chegam durante o evento.

O melhor policial do ano: Rainha Vermelha

Há uma novidade muito especial para quem gosta do género policial, com um aroma que faz lembra Stieg Larsson e a série de TV O Mentalista. Mas essa lembrança é logo esquecida, pois Rainha Vermelha, do espanhol Juan Gómez-Jurado, tem 462 páginas como um registo e volta-faces que há muto tempo não é oferecido ao leitor. E não é só para quem seja fã deste género, pois Rainha Vermelha é um bom exemplo de como um policial pode tratar de temas sociais muito atuais sem cair no facilitismo. Este é o primeiro volume de uma trilogia indispensável para quem quer passar muito boas horas com um livro e será a melhor surpresa da Feira do Livro. (Pavilhão da Editora Planeta)

O livro mais esperado: Elena Ferrante

A italiana Elena Ferrante está de volta com um novo romance após o sucesso mundial da tetralogia A Amiga Genial. Intitula-se A Vida Mentirosa dos Adultos mas só chegará à Feira no dia 1 de setembro. A primeira frase explica logo ao que Ferrante vai: “Dois anos antes de sair de casa o meu pai disse à minha mãe que eu era muito feia.” A partir daí, a escritora, seguindo o guião que deu certo antes, vai descrever os vários lados da amizade feminina através de uma jjovem de 12 anos. É claro que Giovanna é napolitana, tem uma irmã para ser comparada, e vai viver uma hecatombe emocional através de vários episódios na sua vida e na da sua família. O cenário é a localidade de San Giacomo dei Capri, e a protagonista será retratada até à idade de 16 anos, sob todas as memórias que lhe infernizaram o crescimento e a tornaram violenta. (Pavilhão da Relógio D’Água)

A biografia imperdível: Amália

Em ano de centenário, a fadista Amália tem uma primeira biografia intensa e reveladora de todas as facetas da sua vida. A partir desta edição, de autoria de Miguel Carvalho, a mais mítica cantora portuguesa desde sempre pode ser olhada e compreendida de uma outra forma do que com todos os cichês que até agora preenchiam os relatos de uma vida, muitas vezes mais ficcionada e mal interpretada do que é dada agora a conhecer ao leitor. Tudo começa logo na capa, com uma fotografia de Amália como nunca se a vira e um subtítulo inesperado Ditadura e Revolução e a inscrição de uma promessa: A história secreta. E estas 603 páginas não faltam à verdade prometida. (Pavilhão D. Quixote)

A reedição fundamental: Kaputt

Entre os livros míticos e ao mesmo tempo malditos há um que sobressai: Kaputt. De autoria de Curzio Malaparte, que é um dos europeus seduzidos pelo lado mais negro da II Guerra Mundial e dá-se bem com as estrelas do universo nazi. Em quase 500 páginas agora reeditadas, relata os cenários das frentes de batalha suportado na presença física desde as invasões da Polónia até à Finlândia e descreve o comportamentos, a manipulação, as intrigas e a as violências desses enfrentamentos que abalaram o continente europeu durante anos. Malaparte pretende contar o que viu e ouviu na sua romaria ao lado dos inimigos, que inclui toda a espécie de apaniguados do III Reich, desde as altas patentes do exército alemão aos soldados, as figuras da aristocracia e povo europeus subjugados. O livro teve como base uma série de reportagens para o jornal italiano Corriere della Sera, mas o que revela daquela época entre 1941 e 1943 continua a ser demasiado atual e necessitado de ser experimentado através de uma leitura crítica (Pavilhão Editora 20/20)

A revisão histórica oportuna: João de Melo

Estará na Feira do Livro um romance bem diferente do que é habitual na literatura portuguesa: Livro de Vozes e Sombras. De autoria de João de Melo, o escritor realiza em 370 páginas uma alegada investigação à sublevação açoriana da FLA a seguir ao 25 de Abril de 1974. Essa é a proposta oficial, mas o que o que o romance traz de original é fazer uma radiografia tripartida desses tempos e dos que se seguiram em 1975. Começa pelos Açores, continua por Lisboa, sem esquecer outras partes do país, onde a onda revolucionária inflama os portugueses obscurecidos pela ditadura de décadas e os deixa tão loucos como aquilo que é reproduzido no terceiro espelho deste livro, a descolonização. Um romance que é uma das melhores – e inéditas – revisões da História da Democracia portuguesa e que abre um caminho para fixar a verdade dos acontecimentos que caracterizam essa época nacional. (Pavilhão D. Quixote)

Cinco livros a não ignorar…

O novo romance de Colson Whitehead, Os Rapazes de Nickel, só chegará à Feira do Livro já o evento estará em velocidade de cruzeiro. Mas após o fabuloso Estrada Subterrânea, este é daqueles romances a que não se pode ficar indiferente, tanto pela sua história como pela beleza da escrita. (Pavilhão Penguin Random House)

Rapariga, Mulher, Outra é o título do romance premiado de Bernardine Evaristo que relata a vida das mulheres negras na sociedade inglesa e que é fundamental num tempo em que as questões de identidade étnica se mantêm um pouco por toda a parte e que estas histórias cruzadas realçam. (Pavilhão Grupo 20/20)

Entre os ensaios mais recentes de autores portugueses está Três Retratos – Salazar, Cunhal e Soares, de António Barreto. É uma das novidades mais importantes no que respeita à vida política portuguesa, principalmente por ser uma das analises mais lúcidas e profundas de três portugueses que mudaram a vida de todos os portugueses no século XX e ainda nos tempos que vivemos. (Pavilhão Relógio D’Água)

 Rio das Flores foi o romance de Miguel Sousa Tavares que se seguiu ao maior sucesso de vendas e de leitura do século XXI português, Equador. O autor mudou de editora e este é a primeira reedição dos seus livros, romance que ganhou uma outra dimensão com o passar do tempo e o fim da sombra de Equador sobre si. Com uma capa que expressa um dos melhores trabalhos gráficos do ano e que as editoras raramente se esforçam por oferecer ao leitor. (Pavilhão Porto Editora)

A autobiografia de Woody Allen, A Propósito de Nada, é uma leitura fundamental para todos os que gostam de cinema, mas as acusações que pendem sobre o realizador tornam este livro obrigatório. O leitor sente-se como se lesse um livro de ação tal é a torrente de acontecimentos, factos e explicações que dá. Principalmente, além de tudo o que alega num caso que só o seu colega Hitchcock conseguiria meter no argumento de um filme, mostra como é a vida. Até a de Woody Allen, o rei das piadas que agora quase foram silenciadas. (Pavilhão Almedina)

João Céu e Silva DN