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Conheça as mulheres que estão a dar cartas no negócio dos vinhos em Portugal

JE conta a história de Leonor Freitas, da Casa Ermelinda Freitas, Olga Martins, da Lavradores de Feitoria, Rita Nabeiro, da Adega Mayor, Filipa Pato, da Pato e Wouters, e Luísa Amorim, da Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo e Quinta da Taboadella.

Leonor Freitas, Casa Ermelinda Freitas
Leonor Freitas assumiu o cargo de sócia-gerente da Casa Ermelinda pouco depois do pai, Manuel João
de Freitas Jr, ter falecido, fazendo dela a única na linha de sucessão na liderança da empresa.

Leonor Freitas, Casa Ermelinda Freitas

“Tenho de reforçar que no início não foi fácil, tive de dizer muitas vezes a mim própria que não era por ser mulher que não ia dar continuidade ao trabalho, que tinha sido feito pela minha família, com muito esforço e sacrifício, pois o trabalho rural nunca foi fácil”, contou a própria ao JE, admitindo ter passado por dificuldades de adaptação
no início da carreira como líder da empresa, nomeadamente, por ser, por vezes, a única mulher a estar presente numa assembleia deste sector.

Embora tenha passado por dificuldades de adaptação, o crescimento da empresa, nestes últimos anos, tem sido notável.

A Casa Ermelinda Freitas é hoje considerada uma das melhores produtoras de vinho no país. Desde que Leonor Freitas assumiu a liderança, a empresa já arrecadou mais de 600 prémios e distinções em todo o mundo e este ano foi eleita produtor europeu do ano pela segunda vez consecutiva no Sommelier Wine Awards 2020.

Na verdade, até a própria sócia-gerente foi merecedora de uma distinção pelo ex-presidente da República, Cavaco Silva, com o grau de comendador da Ordem de Mérito Agrícola.

Em matéria de igualdade de género, a responsável considera que o sector do vinho não é diferente dos restantes, embora este seja predominantemente liderado por homens.

“Na minha opinião existe igualdade de géneros em muitas empresas. Aqui, nos vinhos, minoritariamente, uma vez que, como todos sabemos foi e ainda é, mas em evolução, um sector de predominância masculina”, afirma, acrescentando que, apesar de tudo, o sector caminha na direção certa.

“Penso que a sociedade é dinâmica e que a mulher tem vindo cada vez mais a ocupar cargos de gestão. Vamos no caminho da igualdade, ou seja, as pessoas certas nos cargos certos independentemente do género”, vinca.

 

Olga Martins, Lavradores de Feitoria
Olga Martins é a atual CEO da Lavradores de Feitoria, mas o gosto pelo vinho não esteve sempre presente na sua vida. Quando entrou para a empresa vinícola do Douro, Olga confessa que “tudo aquilo que faltava em experiência era largamente compensado por um entusiasmo vibrante”.

Olga Martins, Lavradores de Feitoria

A empresária passou de um curso em engenharia química para a vindima, arregaçando imediatamente as mangas para crescer juntamente com a Lavradores de Feitoria, criada em setembro de 2000, assumindo que o início foi “muito desafiante e interessante”, conta ao JE.

A empresária entrou na empresa com apenas 26 anos e, aos 45, admitiu que “crescer com a empresa tem sido uma viagem dura, difícil em muitos momentos mas com um saldo muito positivo”, compensado por todo o trabalho elaborado até à data e aos vinhos criados sob a sua supervisão.

A paixão da CEO da Lavradores de Feitoria pelos vinhos está ligada à sua paixão intimista pela região do Douro. “É uma região única, que me deixa assoberbada pela paisagem, pela história, pela resiliência e pelo carácter, que depois se vê refletido nos vinhos”. Ao JE, Olga confessa que “a noção do quão pequenos e efémeros somos” é algo de profundamente marcante para si. “Andar numa vinha velha, beber um Porto com 100 anos… faz-me pensar quantas mãos passaram ali, quantas pessoas tiveram noites mal dormidas pela preocupação (como eu tenho agora), quantas vidas, quantos sonhos. É quase poético mas é verdade”, confessa.

As preocupações atuais advêm da pandemia, que penalizaram o segmento dos vinhos. A estratégia da empresária passou por continuar a pagar aos fornecedores e manter a atividade a 100%, e ainda efetuar melhorias nos processos internos.

Em fevereiro de 2015, Olga Martins foi condecorada por Aníbal Cavaco Silva, então Presidente da República, com o grau de Oficial da Ordem do Mérito Empresarial, Classe do Mérito Agrícola.

Referindo a igualdade de género num sector dominado por homens, Olga Martins defende que “não existe ainda um equilíbrio de género, mas acho que estamos a caminhar para lá”, sustentando que sejam “dadas oportunidades iguais” para todos.

Rita Nabeiro, Adega Mayor
Durante a sua infância passeou de bicicleta pelo monte alentejano da sua família, entre as galinhas e vacas, em Campo Maior, antes da fábrica atual da Delta Cafés ser construída – que é o maior negócio da sua família. Em 2004, iniciou-se uma nova etapa, quando o Grupo Nabeiro começou a produzir os primeiros vinhos – hoje soma mais de 350 hectares de produção agrícola, dos quais 80 são vinha.

Rita Nabeiro, Adega Mayor

Rita Nabeiro sempre sentiu uma proximidade especial pelo negócio dos vinhos, um gosto que adquiriu do avô. Talvez também porque a adega foi construída no terreno que percorria de bicicleta. Por isso, acompanhou de perto o projeto: viu as paredes do edifício idealizado pelo arquiteto Siza Vieira serem erguidas até se tornarem no que é hoje, o símbolo da Adega Mayor.

A atual CEO da empresa de vinhos é uma das poucas mulheres no sector, mas olha para a igualdade de género com otimismo.

“No sector do vinho tem havido uma evolução positiva mas, tendo sido este um território masculino por excelência durante muitos anos, a representatividade das mulheres ainda é reduzida face aos homens”, conta a responsável ao JE, descartando desde logo ter sentido dificuldades de liderança associadas ao género.

Rita Nabeiro deixa claro que uma pessoa num cargo de liderança deve ser “competente, humana e exigente para consigo própria e para com os outros, independentemente do género”, no entanto, não desvaloriza que caso o seu exemplo sirva de inspiração para alguém, seja no sector dos vinhos ou outro, para proporcionar uma oportunidade a uma mulher para ocupar um lugar de liderança, que o encara “como um reforço extremamente positivo e saudável”. Formada em marketing e design, a CEO da Adega Mayor conta que “foi necessário sair da zona de conforto, aprender sobre vinhos, gestão, liderança” para encarar o desafio deste negócio familiar.

“A oportunidade de liderar a equipa da Adega Mayor surgiu de forma natural e consensual no seio da família”, refere. “Aconteceu sem pompa e circunstância, mas com a confiança e responsabilidade que o cargo exige”, sublinha.

 

Filipa Pato, Pato e Wouters
Filipa Pato pertence a uma longa linhagem de produtores de vinho na Bairrada, que remonta ao século XVIII, pelo menos. Filha de Luís Pato, o primeiro a acreditar a sério nas potencialidades da Baga e a colocá-la no radar dos grandes críticos do sector, foi a primeira, e até agora única mulher portuguesa a ganhar o Óscar do Vinho, distinção atribuída pela prestigiada revista gourmet alemã “Feinschmeker”, em 2011.

Filipa Pato, Pato e Wouters

Licenciada na Universidade de Coimbra em engenharia química, a empresária refinou as suas habilidades de produtora de vinhos fazendo colheitas em Bordeaux, França, Mendoza, na Argentina e Margaret River, na Austrália, com o pai.

Em 2001, surgiu a oportunidade de inaugurar a empresa e, em 2006, juntou-se o marido belga, William Wouter, com quem viveu, até 2014, em Antuérpia.

Hoje,Filipa Pato faz parte de uma geração de mulheres que lidera uma empresa num sector em Portugal que ainda é predominantemente masculino.

“Na área dos vinhos em particular, em Portugal ainda é difícil ser mulher num mundo dominado por homens,
e não é por acaso que ainda muitos produtores olham mais para os filhos homens como continuadores do
seu trabalho”, conta a responsável ao JE.

Quanto aos vinhos, a produção, que se mantém alinhada com os valores familiares, “espelham de forma autêntica a região, usando apenas castas autóctones, algumas vinhas centenárias e viticultura biodinâmica”, explica.

“Hoje temos as nossas vinhas certificadas em biológico e em biodinâmica, revitalizámos áreas que estavam mortas pelo uso e abuso de herbicidas e pesticidas, criámos biodiversidade e um ambiente puro e saudável”, prossegue.

A Pato e Wouters produz perto de 100 mil garrafas, exportando para cerca de 30 paíse e é hoje uma produtora de renome de vinhos da Bairrada.

“Penso que ainda não há igualdade nas grandes empresas, mas é bom ver que há cada vez mais mulheres empreendedoras sem medo de arriscar, mesmo que a uma escala mais pequena”, considera.

 

Luísa Amorim, Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo e Quinta da Taboadella
A empresária Luísa Amorim lidera, atualmente, três produções de vinho: Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo, Quinta da Taboadella e Herdade Aldeia de Cima, sendo que o último é um projeto pessoal da própria.

A filha mais nova do também empresário Américo Amorim assumiu as rédeas da indústria do vinho no seio do grupo e família Amorim, sendo um dos nomes mais sonantes do meio.

Luísa Amorim, Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo e Quinta da Taboadella

Em 2018, Luísa Amorim juntou a Quinta da Taboadella aos hectares que já tinha disponíveis no Norte. A empresária refere ao JE que “já há muitos anos que estávamos à procura de um projeto para investir no vinho e curiosos pela região demarcada do Dão e, em 2018, surge a oportunidade deste tesouro escondido”, juntando à primogénita e vizinha Nossa Senhora do Carmo.

O investimento na Herdade Aldeia de Cima, que levou os socalcos durienses ao Alentejo, foi um desejo mais pessoal por parte da empresária. “Desde criança que me relaciono com o Alentejo através do meu pai e da cortiça. Esta herdade é uma propriedade que herdei e em 2017, ano do seu falecimento. Em conjunto com o meu marido e as minhas filhas, decidimos plantar uma pequena vinha em patamares tradicionais na Serra do Mendro e foi assim, num ano marcante para todos nós, que começa este pequeno projeto de família”, conta Luísa Amorim.

Assumidamente apaixonada pelo vinho, Luísa Amorim confessa que existem tantas coisas que gosta que “talvez um bom copo de vinho [como manda a radição] e uma folha de papel não chegassem para partilhar o que mais me apaixona”.  “Temos de ter amor pelo que estamos a fazer, sobretudo quando trabalhamos com vinho. A natureza, a criação humana, o ver crescer, o desafio constante, o ambiente humano, o amor à terra, a simplicidade”, enumera, demonstrando que é preciso mais do que simplesmente uma boa vinha e chuva.

Face à igualdade de género, Luísa Amorim confessa que “nunca senti diferenças e nunca fiz distinção entre géneros nas nossas empresas”, sustenta, acrescentando que cada vez mais encontra mais mulheres no mundo dos vinhos.

Fonte: Jornal Económico