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Caminhar em Contramão – A leste de Budapeste (Rákosmente, XVII)

Já o referi anteriormente: as direções não são inocentes.

Tendemos a tomar o Norte como ir em frente, embalados pela decisão acertada. Ao Sul, por seu lado, costuma-se associar a folia, os momentos da nossa vida em que a disciplina dá lugar à diversão sem compromisso, celebrados na famosa cancão de Rafaella Carrà: para hacer bien el amor hay que venir al sur.

O Oeste é parente do Norte, ambos pertencem à região correta, ou onde as coisas (ou o mundo, esse palavrão) acontecem. Relegando o Leste para sinónimo de longe, espécie de contra-lugar, igualmente imortalizado na novela “East of Eden”, de John Steinbeck.

Obviamente, as supracitadas noções são produtos do Ocidente, não fossemos nós Ocidentocêntricos. Ou não somos todos auto-cêntricos, tomando os demais por exóticos ou, no mínimo, excêntricos?

Os ilhéus (tenho em mente os Japas) batem-nos aos pontos no umbiguismo: aos seus insulares olhos, a demografia da humanidade escreve-se numa simples equação: eles vs. os outros. Ainda assim, aqui no Ocidente, insistimos em nos penitenciar pela suposta sobranceria (alguns denunciam-no como supremacia) para colmatar a ausência de problemas (e que, de fato, constitui o verdadeiro problema de que padecemos).

Rákosmente é o bairro mais a leste de Budapeste. Eventualmente, avistarão o centro da cidade como, por estas bandas, se costuma cogitar Bruxelas ou o chamado coração do continente: uns com desconfiança, outros com embasbacamento.

Rákosmente é também o maior, geograficamente falando, dos bairros. Imagino-o uma paralela cidade dentro (ou na periferia) da cidade.

Os bairros não se medem aos palmos; no entanto, ser simultaneamente o maior e mais a leste entre os vinte e três, confere-lhe um indesmentível estatuto.