Ângelo de Lima (Portugal)

por João Miguel Henriques
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Pára-me de repente o pensamento

Pára-me de repente o pensamento
como que de repente refreado
na douda correria em que levado
Ia em busca da paz, do esquecimento…

Pára surpreso, escrutador, atento,
como pára um cavalo alucinado
ante um abismo súbito rasgado…
Pára e fica e demora-se um momento.

Pára e fica na douda correria…
Pára à beira do abismo e se demora
e mergulha na noite escura e fria

um olhar de aço que essa noite explora…
Mas a espora da dor seu flanco estria
e ele galga e prossegue sob a espora.

 

Nasceu no Porto em 1872, filho do poeta romântico Pedro de Lima. Frequentou o Colégio Militar, em Lisboa, de onde foi expulso, e a Academia de Belas Artes do Porto. Conspirador da revolução republicana de 31 de Janeiro, foi enviado, um pouco antes desta ocorrer, numa expedição militar a Moçambique entre 1891 e 1892 . Após o seu regresso de África começou a manifestar os primeiros sintomas de loucura, que conduziram ao seu internamento, entre 1894 e 1898, no Hospital Conde Ferreira. Foi nessa época director artístico de «A Geração Nova». Continuando a sua actividade poética e artística, foi de novo internado em 1901, em Rilhafoles, onde permaneceu grande parte da sua vida.

Acolhido pela primeira geração modernista, a sua poesia foi revelada pela revista modernista Orpheu, que publicou pela primeira vez um conjunto significativo de poemas seus no segundo número da revista. Nesses poemas notavam-se já algumas das características mais marcantes da sua poesia, nomeadamente o carácter desviante da sua linguagem e o emprego de vocábulos novos, o que o aproximava da corrente simbolista e modernista. Ângelo de Lima, nos seus momentos de lucidez, foi compondo poemas que vieram a lume em «Poesias Completas» 1971 . São notáveis alguns dos seus sonetos. Na sua obra há sinais precursores da escrita automática dos surrealistas. Tão vaga era a sua poesia que algumas das suas composições não chegavam a exprimir fosse o que fosse de literal. A sua linguagem poética parece reflectir a doença mental que o vitimou, e os seus versos, se por vezes dão a sensação de terem sido escritos no mais completo estado de alucinação, conseguem também ser extremamente lúcidos e bem construídos.

Ângelo de Lima faleceu em Lisboa em 1921, no Hospital de Rilhafoles.

 

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