É indiscutível que no palco europeu, mesmo no palco mundial, Viktor Orbán tem um peso e um destaque muito superior – é muito mais importante e influenciador do que a importância efetiva da Hungria possa justificar. No contexto internacional, Orbán só por si é muito mais que toda a Hungria junta!
Encontro Johnson – Orbán em Londres, sexta-feira (28 de maio)
O simples facto de que, desde o Brexit, Viktor Orbán foi o segundo líder, entre os países da União Europeia, a ser recebido na Downing Street Nr.10 por Boris Johnson, dispensa outros comentários.
Sabe-se que a reunião foi a pedido do PM Húngaro, pedido feito há vários meses. Sabe-se que a Hungria vai assumir em breve a liderança do Grupo Visegrád (Hungria, Eslováquia, República Checa e Polónia).
Sabe-se que apesar das divergências profundas (p.ex democracia iliberal), da “proximidade política europeia” entre o Partido Conservador e o Fidesz. Sabe-se da importância relativa das relações económicas e comerciais bilaterais, mas sem a personagem “Viktor Orbán”, não teria havido meeting em Londres.
“A cooperação com a Hungria é vital para a prosperidade e segurança do Reino Unido”
“A cooperação com a Hungria é vital para a prosperidade e segurança do Reino Unido”, afirmou, para surpresa de muitos, o porta-voz de Boris Johnson dois dias antes do encontro com Orbán, salientando que a reunião seria uma “boa oportunidade” para “promover os interesses britânicos nesta região e discutir os problemas de forma mais ampla”.
Orbán: Antítese de tudo o que o Ocidente significa (The Times)
Críticas e análises à visita. Na véspera da visita oficial de Orbán a Londres, o jornal conservador The Times não foi nada ”meigo” para com o nosso PM. (Nota necessária: na narrativa do orbanismo mais comum, depois de um artigo assim, o The Times só pode ser, no mínimo, um pasquim de esquerda cosmopolita e cripto-comunista).
O The Times escreveu que Orbán é antítese de tudo o que o Ocidente significa. Domesticou e transformou o seu país num campo de ensaio, numa versão de autoritarismo do século XXI, mistura de capitalismo para os amigos, retórica de extrema-direita e uma cultura política de partido único. Viktor Orbán é o líder indiscutível da claque europeia, adepta da China e da Rússia, o seu aliado mais seguro entre os 27 países membros da UE.
O liberal The Guardian escreveu ”Boris Johnson dá as boas-vindas ao Primeiro-Ministro húngaro, um crítico feroz de Joe Biden e aliado da China”.
As posições divergentes
Antes da visita e questionado sobre os comentários feitos por Orbán, que afirmou repetidas vezes que a Europa está “ameaçada por uma invasão muçulmana”, o porta-voz de Johnson declarou que Londres não iria hesitar em levantar questões problemáticas relacionadas com os direitos humanos. “Que fique claro, o Primeiro-Ministro condena as declarações, que semeiam divisão e que são falsas”, acrescentou o porta-voz, referindo-se a Viktor Orbán.
O elogio de Orbán ao Reino Unido
Depois do Brexit, a Hungria sente muito a falta da presença britânica no seio da União Europeia, tínhamos muitas posições coincidentes e por isso os 2 países precisam de construir novos laços bilaterais, disse na sexta-feira à Rádio Kossuth, Viktor Orbán antes de ir para o aeroporto para tomar o avião para Londres, para reunião com o seu homólogo britânico.
“Não esquecer que estamos a falar de uma potência nuclear que abandonou a UE, o que foi mau para nós e continua a ser mau para nós. Sofremos com a ausência da Grã-Bretanha”, disse Orbán.
As declarações de Orbán depois da reunião
Durante o período em que ambos os países eram membros da UE, a Hungria e o Reino Unido desenvolveram e reforçaram as suas relações bilaterais, disse Orbán aos jornalistas após reunião com Johnson. Agora a tarefa da Hungria nas suas relações com o Reino Unido é estabelecer novas formas de cooperação.
Orbán disse que as suas conversações com Johnson, em primeiro lugar, se tinham centrado no futuro das relações bilaterais, e também das oportunidades de cooperação entre a Grã-Bretanha e os países do Grupo de Visegrád.
Destacou as indústrias de energia e defesa como duas áreas “particularmente promissoras” do relacionamento bilateral.
Em resposta a uma pergunta, Viktor Orbán disse que nas conversações com Johnson também tinham abordado questões políticas relativas à democracia, à imprensa, à comunidade LGBT e ao Estado de direito.
Orbán disse que a magistratura húngara estava entre as mais independentes da Europa, e que havia uma abundância de publicações no país que são críticas ao governo. O primeiro-ministro rejeitou as acusações de anti-semitismo como “simplesmente ridículas”, recordando que a Hungria tinha uma grande e próspera comunidade judaica.
Orbán rejeitou a ideia de que o multimilionário George Soros tinha sido alvo de ataques anti-semitas. Chamou Soros de “talentoso empresário húngaro”(!), acrescentando que ele era também um “sério rival” por “apoiar a migração” e “financiar ONGs que a organizam”. “Não gostamos disto, mas isto não tem nada a ver com a sua identidade étnica”, disse Orbán.
Boris Johnson pediu a Orbán que promova a democracia na China, Rússia e Bielorrússia
Por seu lado e de acordo com o comunicado do Gabinete de Johnson, os 2 líderes discutiram entre outros assuntos, os desafios das alterações climáticas, e Johnson expressou as suas preocupações sobre a situação dos direitos humanos na Hungria, particularmente no que diz respeito aos direitos das pessoas LGBTQ, liberdade de imprensa e igualdade de género.
Como a Hungria vai assumir em julho a presidência do Grupo Visegrád, Boris Johnson transmitiu a Orbán o desejo de “de no futuro trabalhar com este Grupo de países de forma mais estreita”.
Johnson apelou a Orbán a exercer a sua influência para promover a democracia e a estabilidade” através dos seus contatos privilegiados que tem com a China, Rússia e Bielorrússia.
Da leitura da imprensa inglesa e alguma húngara sobre a reunião, podemos destacar como primeira evidência ou última conclusão: Orbán foi muito mais caloroso com Johnson do que o contrário.
Político realista – Apregoa água mas bebe palinka
Não é de hoje, mas na diplomacia entre países “adultos”, não há amizade, ou aliados eternos. Há interesses – estratégicos, económicos, políticos ou outros, e pragmatismo. muito pragmatismo.
É esta a filosofia de Orbán, que a pratica mesmo quando, para se dar um ar mais religioso, como o fez na quinta-feira passada, quando recebeu o líder da extrema-direita espanhola. Escreveu na sua página FB “Encontro com Santiago Abascal Presidente do Vox. Defesa das fronteiras, política de família, cultura cristã – pensamos que é disso que depende o futuro da Europa”.
Se tivesse estado com o comunista chines Xi Jinping ou com o islamista turco Erdogan, a narrativa teria sido muito diferente.
Orbán ele mesmo, que aproveita cada momento para se vestir de padre ou frade cristão, daqueles típicos, que apregoa água e bebe palinka da melhor.
András Gellei, Budapeste, 30 de maio de 2021